O desejo de morar no silêncio das coisas, 2014 a 2016.
texto, vídeos e fotografias | text, films and photos
Impressão a jato de tinta em papel algodão | Inkjet print on cotton paper
tamanhos diversos
Projeção de vídeo | Video projection
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Exposição individual | Solo Show
casaCASULOabraço
F.Studio - Fábrica Bhering, RJ
Agosto 2017.
Curadora | Curator : Priscila Medeiros
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Exposições coletivas | Group shows
Incidente - Exposição comemorativa dos 30 anos de PPGAV (clipping)
17 a 24 de junho de 2015.
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(trecho:)
A ausência do outro segura minha cabeça debaixo da água; pouco a pouco, sufoco, meu ar se rarefaz: é por essa asfixia que reconstituo minha “verdade” e preparo o Intratável do amor. (BARTHES, 2003. Pg. 41)
Trago aqui um recorte de minha experiência. Sou bilíngue desde criança e por muitos anos morei em duas casas. Numa casa aprendi a língua brasileira de sinais e na outra aprendi a língua portuguesa. A experiência dessas duas moradas me ensinou que para cada língua havia uma maneira específica de se lidar, que no meu caso se dividia entre a leitura de signos gestuais e a fala, a escuta e a escrita. As línguas de sinais diferem das línguas orais por sua modalidade espaço-visual, ou seja, o corpo lida com o espaço que o circunda através do discurso que se sustenta pelas mãos e principalmente pelo olhar. Além dos sinais que correspondem às normas de construção da própria LIBRAS¹, tive contato também com alguns gestos inventados que apareciam por vezes nos desvios do discurso inseridos na intimidade do cotidiano, eram os gestos mais expressivos e instigantes.
Minha atenção se volta às localizações em que cada gesto é feito no corpo, já que contextos e significados mudam completamente se um mesmo movimento com as mãos é feito no peito, ou na boca ou em direção ao ouvido, por exemplo. Costume esse que se mostra presente também em alguns pontos do meu trabalho fotográfico como na atenção que se volta aos detalhes e recortes de coisas e cenas, ao “habitar” outros corpos, gestos, movimentos e fragmentos de espaços com o olhar. Fruto do desejo de habitar qualquer lugar a partir de seus detalhes e que minimamente apresentam traços de memória e ficção instaurando novas ressonâncias até chegar num ponto primordial e que atravessa todas as línguas, sem exceção: O silêncio.
É no desejo de habitar o silêncio como se fosse um abrigo, a própria casa que estabeleço relações, vínculos afetivos com as casas que habitei na infância. A partir do pressuposto de que a produção artística é algo que vem de um imaginário fantasioso e infantil que retorna aos poucos, de maneira fragmentada através de imagens e ficções. O ponto a ser questionado aqui se mostra na criação de imagens pela fotografia e nas paisagens imaginárias construídas em relatos e ficções sobre a experiência de conviver ao mesmo tempo com duas línguas e duas casas.
Segundo Cage: “Não existe o silêncio. Sempre há alguma coisa acontecendo que provoca um som” (CAGE apud SONTAG, 2015. P. 17). Logo, é na promessa de algo que nunca chega que está sempre por vir, que num outro momento do texto questiona-se o seu lugar em relação à escrita nos seus desvios de contexto e significados. O desejo se volta para a própria escrita em análises a respeito de trabalhos de outros artistas que o deixam como rastro da experiência estética. Diversas questões surgem adjacentes à esta ideia como, por exemplo, a ausência e a ideia de esvaziamento ao se falar metaforicamente sobre o branco e a margem da folha de papel. Também, ao pensar que o processo de escrita assim como o processo artístico são frutos de uma necessidade, ou de um desejo que não estabelece uma noção de endereçamento prévio, porém se considera a presença futura de um leitor ou espectador que até então se revela generalizante ou ausente.
O uso de diferentes fontes, tipografias no decorrer deste texto se dá por dois motivos: gosto de usar a diversidade e o destaque visual em algumas expressões e palavras como uma forma de tornar o texto menos padronizado. Além disso, é através dessa visualidade que é possível obter uma musicalidade metafórica, na leitura. Um enlace encontra-se aí: nesta ideia contida através da diversidade da tipografia, são como diversos tons emitidos do corpo próprio do texto.